sábado, 6 de setembro de 2008

MORAL DA MINHA HISTÓRIA

Quem conhece um pouco de mim, sabe que a três anos passei por uma cirurgia complexa e imprevisível. Estou aqui, viva e cultivando as coisas simples que amo. Por questões politicas, consegui em apenas 2 dias estar no melhor (pelo menos à mim, é o melhor) hospital de referencia em reabilitação do país. O Sarah Kubischeck em Brasília. Fiquei internada por 15 dias entre internação e recuperação. Foi um milagre para a medicina eu ter recuperado todo o problema nesse espaço de tempo. Tive grandes admirações por parte da equipe medica e, hoje, faço parte de um grupo pequeno de pessoas no mundo, que tiveram tamanha recuperação e, sem sequelas ou traumas. Estaremos indo em Outubro à Boston, à Conferencia Mundial de Saúde. Seremos apresentados a uma comissão, e nossos casos, expostos para estudos posteriores e pesquisas. Isso não é demais??? Bem, à vista de muitos sim. Para mim, não vejo muita honras, não gosto desse fardo de honras, não vejo meu caso como algo fenomenal, admirável. Considero como uma fase de dor, desajustes, desarmonia, que foram transitórios. Não há um sofrimento eterno em nenhuma parte desse universo. Há seres que sofrem maior ou menor espaço de tempo, dependendo da natureza de seu equivoco. Quem ainda não pode visitar o Hospital, que o faça em alguém momento. Eu, por questões politicas, pude escolher o apartamento que queria ficar. Lógico que me colocaram em algo confortabilíssimo (por questões politicas), mas não era o lugar que eu me sentira bem. Eu precisara de estar com as pessoas, de -las, senti-las. Numa tarde, pedi à chefe de enfermeiras, que eu precisava ficar na Ala aberta, juntos com pessoas, que eu era uma tagarela e para minha recuperação, isso seria mais que necessário. Atendido o pedido. Yes!! Era la mesmo que eu desejava estar. Ao meu lado tinha uma mulher de uns 46 anos, Maria de Fátima, professora do ensino médio, divorciada, trabalhava em Trindade, interior de Goiás. Estava ali porque não conseguia andar, e a equipe medica não sabia o que fazer, pois não encontraram nada em seu corpo, que justificasse a ausência de deambular. Deixaram-na por mais dez dias com a equipe de Terapeutas (como se chamam os psicólogos de lá). Pois bem, ficamos amigas, eu quase não podia enxergar nos primeiros dias. Tudo era vulto, mas sem dor alguma. E aquela mulher me deixava intrigada com seu mundo fisiológico, com sua deficiência orgânica, que dentre todos os melhores exames de ultima geração, nada encontrara. Eu podia andar, mas não enxergava, ela enxergava e não andava, estava num leito a minha direita. Eu podia ver os prédios, o jardim, o prédio dos Correios, sentir o vento, que primeiro me cumprimentava e levava meu cheiro, minhas angustia do desconhecido. Ao meu lado, estava ela, com sua angustia, desespero. Para comer era um sacrifício desgraçado, pois o horário das refeições, ela precisava de ajuda, e muitas das vezes, tinha eu para ajuda-la. Sempre fui muita sapeca, moleca. E comecei a sacanear com ela. Como eu andava, pegava sua refeição e colocava a distancia dela, tomava seu cigarro. Isso cigarro. No Sarah é liberado, se o paciente fuma, seu direito é preservado! E deixava no criado do meu leito. O esforço dela era dobrado. No inicio ela aceitou, depois reclamava aos médicos. Eu negava que fazia aquilo. Certo dia, em sua abstinência por seus cigarros, fiz com que ela levantasse, se apoiando no leito. Ela me xingava, falava que pediria para me trocarem de lugar, que não aguentava aquela situação que eu causava a ela. Que estava com problemas na perna et cetera. No sexto dia, ela dava seus primeiros passos e esquecia que, suas pernas doíam, ela simplesmente, levantava e a pequenos passos, chegava ate o maço de cigarros no criado do meu leito. Começou a dar passos e não percebia que aquilo era, psicológico. Um distúrbio, que seu organismo apenas recebia o que sua mente emitia. Aos pouco foi-se criando uma mentalidade, que os Terapeutas, de longe, perceberam, minha atitude e a dela.
MORAL DA MINHA HISTORIA

Eu, com minha molecagem, fiz com que ela tivesse coragem. Eu lhe transmitia coragem, vontade de realização.
Ela, com sua tolerância em aturar minhas molecagens, partilhou metade da minha tristeza. Eu me sentia feliz em -la andando, em leva-la para a varanda para que pudesse fumar seus cigarros e fazê-la rir das minhas bobagens que contava. Eu me sentia rica, contava todas as coisas que eu tenho que o dinheiro não pode comprar. Ela ria muito, e eu partilhava a felicidade, em fazer os outros felizes, apesar dos meus problemas. Saudade da Maria de Fátima.

Ela

2 comentários:

Anônimo disse...

Ao contrário dela, um tia daqui morreu entrevada na cama, mesmo os médicos declarando que ela não tinha problemas neurológicos que a impedisse de andar.

Por amor, ou por intolerância, por raiva, ou por desesperos, nós somos capazes de muitas coisas que duvidamos.

Anônimo disse...

A Claudia Gimenez contou uma historia a época em que ficou internada com cancer no hospital. Foi assim: Ela já estava careca e usava um lacinho colado na cabeça. Uma vez esbarrou num senhora que estava com a perna quebrada e a senhora gritou com ela.

- Ei sua maluca estou com a perna quebrada, não está vendo?

Ela respondeu:

- Ei sua louca que grita alto dentro de um hospital, estou com cancer, não está vendo?

As vezes, o bom humor nos salva até mesmo de nossa loucura.

beijos